ENTREVISTANDO: REVISTA CLAUDIA

Revista Claudia – Por que resolveu fazer um baile?
Nando ReisO bailão é uma enfática afirmação de liberdade e também de comunhão: juntei pela primeira vez músicas de outros autores com as minhas. Como digo no show: não estou tocando só as músicas que eu fiz, mas também as que me fizeram.

Revista Claudia – Como você começou a tocar e compor?
Nando ReisMinha mãe dava aulas de violão, embora não fosse o seu ganha-pão. Tem coisa na minha família que eu só entendi muito mais tarde. Sou o quarto filho, entre cinco. O único ruivo. Dois irmãos tiveram meningite – o Zé Luis, que nasceu antes de mim e
ficou surdo por causa dos remédios que precisou tomar; e a Maria Luiza, a Lulu, que nasceu depois de mim e teve ainda encefalite e paralisia cerebral. Na minha casa, o excepcional era o normal. Nem era questão o fato de um filho ser surdo e o outro ser músico. Simplesmente aconteceu. E minha mãe morreu muito cedo, aos 53 anos. Eu tinha então 26.

Revista Claudia – Aprendeu a tocar com ela?
Nando ReisNão, mas tudo passou por ela: ganhei o primeiro violão da minha avó materna e quem me ensinou a tocar foi minha irmã mais velha. Eu tinha 7 anos. Minha mãe foi estudar fonoaudiologia depois que meu irmão ficou surdo. Entendi assim a relação que há entre ganhar dinheiro, fazer o que é urgente e ainda ter prazer com isso. Essa é minha base. Enfim, acho que a vida é um misto daquilo que você decide e daquilo sobre o qual não se tem controle.

Revista Claudia – Mas você fez suas escolhas. Por exemplo, saiu dos Titãs para investir numa carreira-solo.
Nando ReisA graça não é a gente tentar controlar a vida, mas o modo como nos relacionamos com ela. A liberdade que tenho, tento ampliar no palco dizendo que cada um de nós é responsável por si próprio. Por isso, não gosto de padre, de crítico nem de artista messiânico. De ninguém que acredite que pode dizer o que outro deve fazer. Não é o meu barato.

Revista Claudia – E qual é o seu barato?
Nando ReisGosto de flutuar entre a consciência e o risco. Na verdade, eu sinto muita raiva.

Revista Claudia – Do quê, Nando?
Nando ReisDe tudo o que aconteceu com meus irmãos, da dor que isso gerou neles e na nossa família. Sempre senti essa raiva, mas não sou rancoroso nem vítima de nada. Enfrento o que vier. Mas que ninguém ouse me dizer o que devo fazer.

Revista Claudia – Como lida com dinheiro?
Nando Reis Mal. Produzo e gasto muito dinheiro e me sinto patrulhado. No Brasil do Lula e do PT, por mais que eu pague direito todos os meus impostos, e eu pago, o legal é ser pobre, e eu não sou. Fico puto! No meu país, obter algum destaque parece privilégio, como se você estivesse usurpando o direito dos outros. E eu nem acho que o dinheiro seja tão importante. Não é demagogia, até porque não vejo mal em ganhar dinheiro, o meu é fruto do trabalho. O que me incomoda é que tanta gente ainda não tenha a chance de entrar nessa corrida. Só isso.

Revista Claudia – Você tem cinco filhos. Como se sai em família?
Nando Reis Sou um ótimo pai! Eles foram bem alimentados pelo leite paterno. Ensino em silêncio o que é bom e não escondo minhas fraquezas. E não me sinto mais velho nem mais novo por ter me tornado avô. No fundo, estou dando bandeira de que meu pai é meu ídolo. Ele teve cinco filhos, eu também. Papai vai fazer 80 anos e é um tipão, bem mais bonito que eu, o que não é difícil… eu procuro a beleza.

Revista Claudia – É vaidoso?
Nando ReisSou. Se der, faço academia sete vezes por semana. Cuido do cabelo, gosto de roupas, brincos…

Revista Claudia – Falou sobre drogas quando as crianças chegaram à adolescência?
Nando Reis Gostaria de protegê-los, mas é natural que adolescentes sejam curiosos sobre sexo e drogas. Eles sabem que tenho experiência no assunto. Se me perguntam, eu respondo. Não há tabus, mas não fico falando disso. Assim, ensino que a privacidade deve ser preservada. Não faço apologia de nada e também não dou conselhos. Quem sou eu para dar conselhos? A droga mais difícil que já enfrentei foi a minha mente.

Revista Claudia – Já fez terapia?
Nando ReisFaço análise há 20 anos. Cada um se vira como pode. Tenho tanto nó! Sou atormentado, não facilito. Aliás, eu me atrapalho.

Revista Claudia – Está sozinho, namorando ou não sabe?
Nando ReisComo assim não sabe? Sempre sei do meu coração. Eu me sinto casado. Não cabe dizer mais que isso.

Revista Claudia – O que aprendeu com as mulheres?
Nando ReisTudo. A minha mãe… (Ele chora.) Meu pai e meu avô paterno me deram o
senso da masculinidade e da elegância. Meu avô morava no interior. Quando minha mãe morreu, chegou cedo para o velório. Estava de gravata borboleta, bem-vestido. Aquilo foi para mim um ensinamento a respeito das ocasiões solenes. Sua presença máscula atenuava a minha dor e informava a importância, o lugar da mulher. A beleza feminina é tão imensa. Tudo o que quero é poder contemplar. Marisa Monte e Cássia Eller foram as primeiras a gravar composições suas…
Eu assisti a isso tão maravilhado… Sabe, eu gosto de ser homem, mas queria ser mulher. Sou louco por elas. Minha mãe, minhas professoras, minha irmã, minha avó, minhas filhas, as mulheres que me deram filhos. Foi com Marisa Monte, com quem namorei, e com Cássia Eller que fiz as coisas mais lindas da minha carreira. Elas não são pouca coisa, eu também não: elas me deram a minha medida. Isso basta. Eu só penso em mim.

Revista Claudia – É egoísta?
Nando ReisNão, acho que a gente tem que gostar de si mesmo para poder fazer o outro feliz. Eu gosto e, se não fosse assim, mataria de tristeza os que me amam.

Revista Claudia – Teve muitos amores?
Nando Reis Não, uns quatro ou cinco… Muito mais que isso, seria grave. Não meço as coisas dessa forma. A única coisa que me preocupa, nessa área, é que desperdicei boa parte da minha vida querendo estar num lugar onde eu não estava. Sou ansioso. Nem sempre isso aparece nas minhas canções. Ali se revela o que eu quero ser, não o que sou. Minha música é puro desejo. E meu desejo é criar. Adoro. Trabalho como um lixeiro.

Revista Claudia – Lixeiro?
Nando ReisEles andam de noite com aquela faixa que brilha. E fazem o que têm que fazer. Eu me sinto assim. Como o Paulo Vanzolini, na ronda da cidade.

Revista Claudia – E o sucesso?
Nando ReisNão penso nisso. Esse termo ficou tão poluído, não sou movido por nenhum tipo de status quo.

Revista Claudia – O que te move?
Nando Reis Meu pulmão, meu coração, meu sexo, meus filhos, a necessidade ordinária de ter casa e comida. Preciso de sentido. Converso com os valores vigentes, não estou desligado do mundo, mas eu quero o fundamental: ser feliz e ter prazer.

Revista Claudia – Como é que você aguenta a sua intensidade?
Nando Reis Indo ao limite máximo. Eu sou um Gordini com um velocímetro de Ferrari colado no painel. Então eu acredito e acelero…. Vruuummm!

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